sábado, 14 de março de 2020


O que se pode especular sobre a evolução do Covid-19?

         Desde a descoberta do COVID-19, apelidado de Corona Vírus, em dezembro na China, o mundo está aflito na medida em que o risco de infecção se aproxima de todas as regiões do mundo. Na realidade, o vírus está longe de ser um agente infeccioso mortal, pelo contrário, ele tem uma taxa de mortalidade menor do que outras doenças como o sarampo, por exemplo.
Entretanto, muitos meios de comunicação utilizam o indicador de mortalidade comparando o número de pessoas mortas pela doença ao número de pessoas infectadas, dando uma impressão de taxa de mortalidade baixa. Na verdade, quando o número de pessoas que morreram pela doença é comparado pelo total de pessoas que já passaram por ela (morreram ou se curaram) esse número sobe de 3,7% para 7,4%.
Aqui, o que fica evidente são alguns padrões percebidos de acordo com a análise dos dados divulgados pelo Centro de Ciências de Engenharia de Sistemas da Universidade Johns Hopkins, de Baltimore, nos Estados Unidos. Dentre eles podemos destacar alguns:

1)      Desde o início da infecção, a China teve um pico de infectados em meados de fevereiro e um pico do índice de mortalidade no mês de janeiro, demonstrando que na medida em que as pessoas vão se curando da doença a taxa de mortalidade vai decrescendo;
2)      Os números ativos de infectados na China teve um pico em fevereiro (crescendo mais de 3.000%) e decresceu consideravelmente em meados de março (queda de 80%);
3)      A Taxa de mortalidade decresceu consideravelmente ao longo de dois meses na China, tendo alcançado um pico em janeiro, com 46,67%, reduzindo em meados de fevereiro, com 14,03% e ainda mais em meados de março, que chegou a 4,64%.
4)      Alguns países apresentam uma taxa de mortalidade muito maior do que a média global, a saber, nos Estados Unidos ela é de 81,82%, sim, 81,82% das pessoas que já não mais estão com a doença morreram, as outras 18,18% se curaram. Na França, essa taxa é ainda maior, de 88,35%, na Itália ela é de 42,3%. A Alemanha é um dos exemplos que quebra essa regra e apresenta um índice mais baixo de mortalidade no momento de avanço da contaminação, 16,36%.
5)      Na medida em que a taxa de mortalidade se torna mais baixa é possível verificar que o ciclo de contágio está em uma descendente, restando avaliar a velocidade dessa queda e os cuidados para que novos focos não surjam.

Neste sentido, considerando as medidas de contenção que estão sendo tomadas pelos países com previsão de aumento do índice de infectados, é importante notar que após o pico de crescimento de transmissão, a tendência é de que o número de pessoas que consegue sobreviver à doença comece a minimizar a sua taxa de fatalidade passa a se reduzir. Isso ocorre em conjunto com uma redução do número de casos ativos, que responde tanto às medidas de precauções quanto à taxa de cura que tende a aumentar em massa após cerca de 15 a 20 dias, considerando ser esse o período do ciclo do vírus no organismo. Em outras palavras, se o surto for controlado com medidas de isolamento é possível esperar que o seu ciclo em um país seja de 3 a 4 meses.
Em conclusão, os governos acertam em se precaverem com medidas mais intensivas de isolamento das pessoas e adiamento de eventos públicos e aglomerações, com isso, é possível esperar que a curva de crescimento da infecção não seja tão alta e o número de casos ativos passe a cair o quanto antes.
Em relação ao impacto que esse vírus possui na economia, é possível estimar que o impacto negativo que ele causará no feriado da páscoa e em outros eventos até meados de junho será inevitável. Entretanto, na medida em que os indicadores de casos ativos e de taxa de fatalidade forem decrescendo, será possível verificar em quais locais essas políticas estão funcionando melhor e adotar medidas parecidas pelos países interessados em aplicar políticas públicas efetivas.

sexta-feira, 13 de março de 2020

Se o Brasil não é nem de longe o país mais afetado pelo COVID-19,
por que tem a bolsa que mais cai no mundo?


Estamos em uma pandemia! Na quarta-feira dia 11 de março, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou que o mundo está em uma situação de pandemia relacionada ao vírus COVID-19, descoberto na China no último dia de 2019 e que até a última sexta-feira 13 contava com um número de infectados de mais 135 mil pessoas em todos os continentes. Essa situação tem se agravado diariamente, deixando os mercados do mundo todo em alerta, principalmente por conta na queda da produtividade e do consumo que esse vírus pode causar ao impedir que as pessoas circulem livremente ou deixem de trabalhar.

Mas uma pergunta que aparentemente fica para muita gente é: Por que o Brasil é o país que mais sofre em relação à queda dos investimentos na bolsa de valores se nem de longe é o país com mais infectados por essa doença? Analisando a situação, é preciso compreender que o investimento em ações está diretamente relacionado à propensão dos investidores em assumir risco. Sendo assim, eu relacionaria essa situação de crise na bolsa de valores brasileira a pelo menos 5 fatores:

1) Fator Político 1: Queda na confiança do Governo

Após a eleição de 2018, o Brasil passou a ter uma nova dinâmica de relação entre o poder Executivo e o poder Legislativo. O presidente não possui uma estratégia de relação com o legislativo que busque uma composição de maioria para a defesa de suas pautas de interesse, ao invés disso, ele aposta na mobilização das ruas e das redes (cada vez menor) para a garantia de sua popularidade e do suporte para a aprovação das reformas que ele propõe. Os sucessivos episódios de escândalos relacionados à falta de postura de liderança, falta de capacidade de conduzir situações de crise, pouco apreço às instituições, além da baixa habilidade para lidar com opiniões contrárias - inclusive da imprensa - tem revelado uma face do governo muito mais comprometida com a defesa de pautas ideológicas do que com um projeto de recuperação econômica. Esse perfil de conduta, com apelo cada vez mais confinado a uma parcela radical do eleitorado do atual governo, pode estar contribuindo para o aumento da incerteza relacionada à incapacidade do governo em conduzir o país a uma recuperação real da economia. Com 8 meses de governo (sem qualquer relação com os problemas relacionados ao Corona vírus) o fluxo de recursos estrangeiros na Bolsa de valores brasileira (diferença entre as compras as vendas de ações) acumulava um déficit em torno de R$20 bilhões, em 2019 esse déficit superou a casa dos R$44 bilhões. Esse foi o principal motivo do aumento da taxa de câmbio no período recente.

2) País massivamente exportador de commodities.

O Brasil possui uma balança comercial positiva há um bom tempo em função de seu perfil exportador de commodities (em especial produtos agropecuários e minério). Um dos grandes compradores desses produtos é justamente a China, o principal parceiro comercial do Brasil, e responsável por 26,8% do total de exportações do país. O índice Bovespa possui uma relação direta com empresas desse tipo de produto, a saber, a Vale é a segunda empresa com maior participação no indicador, com 8,74% de representação e a Petrobrás é a quinta, com 4,46% de participação.

3) Alerta nos EUA

Os Estados Unidos são o segundo parceiro comercial do Brasil. Ultimamente a política de proximidade incondicional do governo brasileiro com o governo americano tem feito com que as expectativas de recuperação da economia americana tenham uma maior relevância no mercado interno brasileiro. Nos EUA, os dados sobre o COVID-19 ainda são incertos, não há um sistema público capaz de identificar exatamente o número de contaminados no país. Somado a isso, o sistema de trabalho baseado em remuneração por horas trabalhadas e sem suporte de renda em situações de doença faz com que o risco de contaminação possa estar muito maior do que pareça. Esse fator de imprecisão, além da possibilidade de queda no crescimento norte americano causam apreensão, fazendo com que investidores recuem diante de investimentos com maior propensão ao risco.

4) Fator Político 2: Desalinhamento entre os poderes Executivo e Legislativo

No último dia 11/03 o congresso derrubou o veto presidencial que restringia a ampliação do limite máximo para que idosos e pessoas com deficiência tivessem acesso ao BPC (Benefício de Prestação Continuada). Essa derrubada terá um impacto de pelo menos R$20 bilhões no orçamento neste ano. Mais do que os prós e contras sobre a importância desse benefício, o que fica evidente é o desalinhamento entre os poderes Executivo e Legislativo, incentivado por uma onda de insinuações críticas ao congresso e ao poder judiciário por parte do poder Executivo nas últimas semanas. Essa falta de capacidade política de sustentar projetos no congresso faz com que o investidor reaja com desconfiança e passe a recuar diante da capacidade do governo em sustentar sua pauta de reformas.

5) O Problema do Petróleo: Rússia x Arábia Saudita

A queda na produção por conta do Corona vírus possui impacto direto no consumo de petróleo no mundo fazendo com que os preços dessa commoditie caiam por conta da falta de consumo e do seu excesso de produção. Com isso, buscando garantir espaço nesse setor, a Rússia e Arábia Saudita iniciaram uma guerra de preços a partir desta semana. Basicamente, a Rússia não concordou em reduzir o volume produzido de petróleo que pretendia impedir a queda do preço. Em resposta, a Arábia Saudita que é líder da OPEP (Organização de Países Produtores de Petróleo) anunciou aumento na produção e desconto nos preços a fim de fazer com que sua barganha derrube as condições dos países menos competitivos de comercializar o produto. Isso já tinha ocorrido entre 2011 e 2015, quando o aumento da produção de petróleo a partir de xisto nos EUA levou a OPEP a uma política de queda nos preços do petróleo para impedir o avanço dos Estados Unidos nesse setor. No caso do Brasil, o grande volume de ações da Petrobrás no índice da bolsa de valores tem uma relação direta com o impacto que isso gerou no país. Na medida em que as ações da Petrobrás caem, o índice Bovespa responde de forma direta, dado o grande volume desse papel na bolsa brasileira (4,46%).


Por fim, passado o período de alarme, já é possível esperar que a situação relacionada ao vírus se acalme a partir de meados de junho, pois considerando que os dados de transmissões advindos da China estão começando a se revelar promissores, o tempo para que isso seja assimilado pelos investidores pode demandar um pouco mais de tempo. Já em relação à capacidade do governo em tornar o Brasil um país mais estável e atraente para o investimento estrangeiro, é preciso que os sinais dados pelo governo sejam mais comprometidos com a expectativa de um projeto de longo prazo e menos preocupados em satisfazer clãs radicais de seguidores de redes sociais.