sábado, 25 de abril de 2020

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Finanças Pessoais: Lições que dão em árvores


As caducifólias (do latim: cadere, que significa cair, perecer + folia, de folha, ou seja: folhas que caem) são aquelas plantas que perdem suas folhas em algumas estações do ano, geralmente nos meses mais frios e sem chuva (outono e inverno). Essas plantas evoluíram para não perder água através da evaporação pelas folhas nos momentos de difícil disponibilidade desse recurso.

Essa evolução é uma resposta da natureza quando as plantas precisam tomar decisões a fim de garantir sua sobrevivência da melhor forma possível. Tal como tudo o que há na natureza, nós, seres humanos, também fazemos opções para garantir a melhor forma possível de sobreviver a partir dos recursos que temos.

Essas plantas conseguem ajustar a perda de sua folhagem quando do primeiro sinal de aproximação do frio e da estiagem; esse mecanismo faz com que ela entre em um dilema, pois ao mesmo tempo em que a perda de suas folhas evitará o desperdício de água, isso também acarretará em não produzir energia através da luz. Desta forma, duas reações precisam ser pesadas: deixar de produzir energia para evitar perder água durante um tempo, ou arriscar perder água em momento de estiagem para aproveitar a pouca luz que estará disponível durante esse período?

A resposta da planta nos ensina que a decisão mais inteligente é aquela que consegue administrar os recursos avaliando a menor perda e garantindo que os ganhos sejam os melhores possíveis.

É claro que uma árvore não possui cérebro para fazer essa análise conscientemente. Entretanto, aquelas que conseguem, instintivamente, escolher o melhor momento de perder suas folhas e garantir o melhor resultado possível a partir dos recursos existentes, conseguem sobreviver e transmitir seus genes para as futuras gerações, conseguindo perpetuar espécies cada vez mais adaptadas.

Se olharmos para nossas decisões financeiras de consumo, poderíamos fazer um paralelo com as caducifólias e nos perguntar: será que estamos preparados para perder algumas "folhas" por um tempo a fim de evitar perder recursos valiosos no momento presente?

Pois bem, o consumo dos brasileiros é caracterizado por decisões inconscientes e cheias de impulso. Poupar para nós é algo tão difícil quanto ganhar dinheiro; porém, não perceber a aproximação de tempos difíceis (inverno) pode nos desadaptar às condições nas quais estamos inseridos.

A decisão das caducifólias é um ato de poupança. Na medida em que elas percebem que a luz e a água disponíveis nos próximos meses serão limitadas, tomam a decisão de poupar água em detrimento de preservar o ganho de luz, pois nesse caso, perder luz quando ela se faz escassa é uma decisão cujo prejuízo será o menor possível para obter o prêmio da economia d’água.

As decisões financeiras orbitam em torno de dois paradigmas fundamentais: entrada e saída de dinheiro. As entradas de dinheiro, ou aumento de sua quantidade, depende de fatores que se realizam no longo prazo e com um certo esforço. Para que isso ocorra, é preciso investir em nossa formação, saúde, comportamento, imagem e, sobretudo, em nossas habilidades e competências.

Já as saídas de dinheiro ocorrem, em sua maior parte, no curto prazo, como já dizia Paulinho da Viola: “Dinheiro na mão é vendaval”. Essas saídas podem ser usadas para o pagamento de despesas, investimentos ou consumo. Eis a dificuldade de grande parte das pessoas em lidar com suas finanças: Primeiro não conseguem selecionar suas saídas de dinheiro tendo em mente sua capacidade financeira, e segundo, impulsionadas pelo marketing e pela propaganda, acabam comprando coisas que vão além de sua necessidade. É o caso das caducifólias, caso optassem por manter suas folhas no inverno para aproveitar a pouca luz disponível e acabassem morrendo por desidratação.

Quando medimos os recursos e as necessidades que temos, precisamos ter em mente a lição das caducifólias e preservar, ao máximo, os nossos recursos escassos até encontrarmos uma outra fonte de receita que supere as saídas que pretendemos ter.

Grande parte das pessoas não consegue ter clareza dessa relação e, aproveitando-se de ferramentas como cartões de crédito e cheques, comprometem-se com obrigações futuras que depreciarão sua qualidade de vida. O consumo desnecessário (e desmedido) é a primeira porta para o descontrole financeiro.

Tendo as caducifólias como exemplo, se você identificar que a sua receita não é o suficiente para manter seus recursos preservados, é hora de cortar gastos a fim de que o inverno não retire de você as condições de sobreviver financeiramente em paz.

Ter em mente o tempo em que conseguimos os recursos (longo prazo) e o tempo em que os gastamos (curto prazo) é fundamental para que comecemos a discernir sobre aquilo que pretendemos comprar e/ou poupar.

Evite perder os recursos escassos em prol de pequenas vantagens de curto prazo, busque analisar sempre a velocidade de ganho e perda de dinheiro para que, assim, você consiga preservar os melhores recursos e aproveitar com abundância as oportunidades quando elas aparecerem.



sábado, 14 de março de 2020


O que se pode especular sobre a evolução do Covid-19?

         Desde a descoberta do COVID-19, apelidado de Corona Vírus, em dezembro na China, o mundo está aflito na medida em que o risco de infecção se aproxima de todas as regiões do mundo. Na realidade, o vírus está longe de ser um agente infeccioso mortal, pelo contrário, ele tem uma taxa de mortalidade menor do que outras doenças como o sarampo, por exemplo.
Entretanto, muitos meios de comunicação utilizam o indicador de mortalidade comparando o número de pessoas mortas pela doença ao número de pessoas infectadas, dando uma impressão de taxa de mortalidade baixa. Na verdade, quando o número de pessoas que morreram pela doença é comparado pelo total de pessoas que já passaram por ela (morreram ou se curaram) esse número sobe de 3,7% para 7,4%.
Aqui, o que fica evidente são alguns padrões percebidos de acordo com a análise dos dados divulgados pelo Centro de Ciências de Engenharia de Sistemas da Universidade Johns Hopkins, de Baltimore, nos Estados Unidos. Dentre eles podemos destacar alguns:

1)      Desde o início da infecção, a China teve um pico de infectados em meados de fevereiro e um pico do índice de mortalidade no mês de janeiro, demonstrando que na medida em que as pessoas vão se curando da doença a taxa de mortalidade vai decrescendo;
2)      Os números ativos de infectados na China teve um pico em fevereiro (crescendo mais de 3.000%) e decresceu consideravelmente em meados de março (queda de 80%);
3)      A Taxa de mortalidade decresceu consideravelmente ao longo de dois meses na China, tendo alcançado um pico em janeiro, com 46,67%, reduzindo em meados de fevereiro, com 14,03% e ainda mais em meados de março, que chegou a 4,64%.
4)      Alguns países apresentam uma taxa de mortalidade muito maior do que a média global, a saber, nos Estados Unidos ela é de 81,82%, sim, 81,82% das pessoas que já não mais estão com a doença morreram, as outras 18,18% se curaram. Na França, essa taxa é ainda maior, de 88,35%, na Itália ela é de 42,3%. A Alemanha é um dos exemplos que quebra essa regra e apresenta um índice mais baixo de mortalidade no momento de avanço da contaminação, 16,36%.
5)      Na medida em que a taxa de mortalidade se torna mais baixa é possível verificar que o ciclo de contágio está em uma descendente, restando avaliar a velocidade dessa queda e os cuidados para que novos focos não surjam.

Neste sentido, considerando as medidas de contenção que estão sendo tomadas pelos países com previsão de aumento do índice de infectados, é importante notar que após o pico de crescimento de transmissão, a tendência é de que o número de pessoas que consegue sobreviver à doença comece a minimizar a sua taxa de fatalidade passa a se reduzir. Isso ocorre em conjunto com uma redução do número de casos ativos, que responde tanto às medidas de precauções quanto à taxa de cura que tende a aumentar em massa após cerca de 15 a 20 dias, considerando ser esse o período do ciclo do vírus no organismo. Em outras palavras, se o surto for controlado com medidas de isolamento é possível esperar que o seu ciclo em um país seja de 3 a 4 meses.
Em conclusão, os governos acertam em se precaverem com medidas mais intensivas de isolamento das pessoas e adiamento de eventos públicos e aglomerações, com isso, é possível esperar que a curva de crescimento da infecção não seja tão alta e o número de casos ativos passe a cair o quanto antes.
Em relação ao impacto que esse vírus possui na economia, é possível estimar que o impacto negativo que ele causará no feriado da páscoa e em outros eventos até meados de junho será inevitável. Entretanto, na medida em que os indicadores de casos ativos e de taxa de fatalidade forem decrescendo, será possível verificar em quais locais essas políticas estão funcionando melhor e adotar medidas parecidas pelos países interessados em aplicar políticas públicas efetivas.

sexta-feira, 13 de março de 2020

Se o Brasil não é nem de longe o país mais afetado pelo COVID-19,
por que tem a bolsa que mais cai no mundo?


Estamos em uma pandemia! Na quarta-feira dia 11 de março, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou que o mundo está em uma situação de pandemia relacionada ao vírus COVID-19, descoberto na China no último dia de 2019 e que até a última sexta-feira 13 contava com um número de infectados de mais 135 mil pessoas em todos os continentes. Essa situação tem se agravado diariamente, deixando os mercados do mundo todo em alerta, principalmente por conta na queda da produtividade e do consumo que esse vírus pode causar ao impedir que as pessoas circulem livremente ou deixem de trabalhar.

Mas uma pergunta que aparentemente fica para muita gente é: Por que o Brasil é o país que mais sofre em relação à queda dos investimentos na bolsa de valores se nem de longe é o país com mais infectados por essa doença? Analisando a situação, é preciso compreender que o investimento em ações está diretamente relacionado à propensão dos investidores em assumir risco. Sendo assim, eu relacionaria essa situação de crise na bolsa de valores brasileira a pelo menos 5 fatores:

1) Fator Político 1: Queda na confiança do Governo

Após a eleição de 2018, o Brasil passou a ter uma nova dinâmica de relação entre o poder Executivo e o poder Legislativo. O presidente não possui uma estratégia de relação com o legislativo que busque uma composição de maioria para a defesa de suas pautas de interesse, ao invés disso, ele aposta na mobilização das ruas e das redes (cada vez menor) para a garantia de sua popularidade e do suporte para a aprovação das reformas que ele propõe. Os sucessivos episódios de escândalos relacionados à falta de postura de liderança, falta de capacidade de conduzir situações de crise, pouco apreço às instituições, além da baixa habilidade para lidar com opiniões contrárias - inclusive da imprensa - tem revelado uma face do governo muito mais comprometida com a defesa de pautas ideológicas do que com um projeto de recuperação econômica. Esse perfil de conduta, com apelo cada vez mais confinado a uma parcela radical do eleitorado do atual governo, pode estar contribuindo para o aumento da incerteza relacionada à incapacidade do governo em conduzir o país a uma recuperação real da economia. Com 8 meses de governo (sem qualquer relação com os problemas relacionados ao Corona vírus) o fluxo de recursos estrangeiros na Bolsa de valores brasileira (diferença entre as compras as vendas de ações) acumulava um déficit em torno de R$20 bilhões, em 2019 esse déficit superou a casa dos R$44 bilhões. Esse foi o principal motivo do aumento da taxa de câmbio no período recente.

2) País massivamente exportador de commodities.

O Brasil possui uma balança comercial positiva há um bom tempo em função de seu perfil exportador de commodities (em especial produtos agropecuários e minério). Um dos grandes compradores desses produtos é justamente a China, o principal parceiro comercial do Brasil, e responsável por 26,8% do total de exportações do país. O índice Bovespa possui uma relação direta com empresas desse tipo de produto, a saber, a Vale é a segunda empresa com maior participação no indicador, com 8,74% de representação e a Petrobrás é a quinta, com 4,46% de participação.

3) Alerta nos EUA

Os Estados Unidos são o segundo parceiro comercial do Brasil. Ultimamente a política de proximidade incondicional do governo brasileiro com o governo americano tem feito com que as expectativas de recuperação da economia americana tenham uma maior relevância no mercado interno brasileiro. Nos EUA, os dados sobre o COVID-19 ainda são incertos, não há um sistema público capaz de identificar exatamente o número de contaminados no país. Somado a isso, o sistema de trabalho baseado em remuneração por horas trabalhadas e sem suporte de renda em situações de doença faz com que o risco de contaminação possa estar muito maior do que pareça. Esse fator de imprecisão, além da possibilidade de queda no crescimento norte americano causam apreensão, fazendo com que investidores recuem diante de investimentos com maior propensão ao risco.

4) Fator Político 2: Desalinhamento entre os poderes Executivo e Legislativo

No último dia 11/03 o congresso derrubou o veto presidencial que restringia a ampliação do limite máximo para que idosos e pessoas com deficiência tivessem acesso ao BPC (Benefício de Prestação Continuada). Essa derrubada terá um impacto de pelo menos R$20 bilhões no orçamento neste ano. Mais do que os prós e contras sobre a importância desse benefício, o que fica evidente é o desalinhamento entre os poderes Executivo e Legislativo, incentivado por uma onda de insinuações críticas ao congresso e ao poder judiciário por parte do poder Executivo nas últimas semanas. Essa falta de capacidade política de sustentar projetos no congresso faz com que o investidor reaja com desconfiança e passe a recuar diante da capacidade do governo em sustentar sua pauta de reformas.

5) O Problema do Petróleo: Rússia x Arábia Saudita

A queda na produção por conta do Corona vírus possui impacto direto no consumo de petróleo no mundo fazendo com que os preços dessa commoditie caiam por conta da falta de consumo e do seu excesso de produção. Com isso, buscando garantir espaço nesse setor, a Rússia e Arábia Saudita iniciaram uma guerra de preços a partir desta semana. Basicamente, a Rússia não concordou em reduzir o volume produzido de petróleo que pretendia impedir a queda do preço. Em resposta, a Arábia Saudita que é líder da OPEP (Organização de Países Produtores de Petróleo) anunciou aumento na produção e desconto nos preços a fim de fazer com que sua barganha derrube as condições dos países menos competitivos de comercializar o produto. Isso já tinha ocorrido entre 2011 e 2015, quando o aumento da produção de petróleo a partir de xisto nos EUA levou a OPEP a uma política de queda nos preços do petróleo para impedir o avanço dos Estados Unidos nesse setor. No caso do Brasil, o grande volume de ações da Petrobrás no índice da bolsa de valores tem uma relação direta com o impacto que isso gerou no país. Na medida em que as ações da Petrobrás caem, o índice Bovespa responde de forma direta, dado o grande volume desse papel na bolsa brasileira (4,46%).


Por fim, passado o período de alarme, já é possível esperar que a situação relacionada ao vírus se acalme a partir de meados de junho, pois considerando que os dados de transmissões advindos da China estão começando a se revelar promissores, o tempo para que isso seja assimilado pelos investidores pode demandar um pouco mais de tempo. Já em relação à capacidade do governo em tornar o Brasil um país mais estável e atraente para o investimento estrangeiro, é preciso que os sinais dados pelo governo sejam mais comprometidos com a expectativa de um projeto de longo prazo e menos preocupados em satisfazer clãs radicais de seguidores de redes sociais.

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

    Na mitologia dos Gigantes, a sua jornada

Quando crianças, todos nós já ouvimos histórias sobre gigantes, tais como a do João e o Pé de Feijão, originalmente escrita por Joseph Jacobs em 1890, cujo roteiro revela a história de uma viúva e seu filho curioso e rebelde, que recebera de sua mãe a ordem para trocar a única vaquinha que possuíam por míseros tostões na cidade. Entretanto, durante o caminho, um sujeito estranho o encontra e acaba por lhe oferecer em troca do animal um punhado de sementes de feijão. Acreditando serem mágicas, João decide por realizar a troca, voltando para casa com grande euforia.
Após ser repreendido por sua mãe por causa de tamanha estupidez e ingenuidade, o jovem lança furioso as sementes de feijão pela janela, que para sua surpresa, dão origem a um gigantesco pé de feijão no dia seguinte. O tamanho da planta ultrapassava o limite das nuvens do céu. Tomado pela curiosidade, o jovem resolve escalar o pé de feijão até a casa de um gigante comedor de crianças. Com esperteza, sobretudo, o jovem consegue tomar vantagem da palermice e do descuido do gigante para lograr as riquezas que buscara, conquistando, inclusive, uma pata dotada da capacidade de botar ovos de ouro.
Como nessa história, a figura dos gigantes está presente em nosso imaginário coletivo desde os tempos mais remotos, inundando nossa imaginação com a personificação de um ser dotado de poder, mas insensível às belezas apreciadas por nós humanos. O estereótipo do gigante nos remonta a adjetivos negativos, de pouco apreço à colaboração e ao convívio. Os gigantes estão sempre sozinhos e dotados de quase nenhum atributo de bondade ou humor.
A psicoterapeuta junguiana Marie Louise von Franz, em seu livro The Shadow and Evil in Fairy Tales, destaca coisas interessantes sobre esses seres. Dentre elas, a ideia de que gigantes seriam seres criados antes mesmo dos seres humanos pelos deuses. E como que fadados a encenar o papel de uma espécie experimental, aos gigantes restaria o papel de servirem de cobaias desajeitadas e desprovidas de habilidades que seriam concedidas mais tarde a nós. Na mitologia nórdica, por exemplo, os gigantes existem antes mesmo dos deuses. Nas escrituras sagradas, o roteiro não foge à regra, e ao gigante Golias cabe o papel de guerreiro cruel e invencível.
Entretanto, esse arquétipo pode nos auxiliar a refletir sobre algumas circunstâncias reais em nosso cotidiano – especialmente do ponto de vista profissional – capazes de nos fazer tomar atitudes reais em nosso benefício. Com exceção daqueles que recebem algum tipo de herança e não precisam batalhar para conquistar seu sucesso financeiro, todos nós outros precisamos enfrentar diferentes gigantes ao longo de nossa jornada até a conquista de nossa “pata com ovos de ouro”. Muitas das vezes, a inexperiência com que entramos na vida adulta nos faz agir com certa dose de irresponsabilidade e curiosidade, tal como o João do pé de feijão, que não se contentando com a venda da vaca pelo simples prolongamento de sua miséria, se encanta com algo que poderia ser novo. Essa expectativa lhe saltou os olhos, fazendo disparar-lhe o coração e o dotando de coragem para tomar uma decisão inusitada e corajosa.
Na medida em que crescemos, e os gigantes vão sendo derrotados em nossa trajetória profissional e pessoal, o tempo e o esforço se encarregam de nos presentear com as conquistas que almejávamos enquanto éramos mais jovens. Nossa casa, que antes era um sonho quase intransponível, com o passar do tempo já nem financiada está. O carro, que antes era uma imaginação, muitas vezes é trocado por modelos mais novos de tempos em tempos. As viagens nas férias muitas vezes nem são mais tão preparadas com tamanha expectativa como fazíamos há 10 anos. Da mesma forma, a promoção e o aumento do salário, algo tão esperado, mais cedo ou mais tarde acabam sendo conquistados. Enfim, os gigantes que antes nos tiravam o sono estão quase todos derrotados, nos restando usufruir de certo conforto e acomodação.
Dante disso, o que restaria então? Presentear a história com um final aparentemente feliz? Seria injusto! Ainda que do ponto de vista literário.
Se por um lado a vitória contra os gigantes nos faz atingir certo conforto e alívio, por outro lado, muitas vezes confundimos uma vaca cujo leite ainda não secou com uma pata capaz de botar ovos de ouro.
Da mesma forma que devemos fugir do conformismo de João com a vaquinha até o recebimento da ordem de sua mãe, devemos repelir a desesperança da pobre velhinha. Mais ainda, para que nossa história possa ser contada com letras maiúsculas, precisamos assumir o papel de buscar algo novo no roteiro, capaz de romper o paradigma da conformidade, de nos fazer acreditar em ultrapassar os limites estabelecidos pelas circunstâncias da vida. Para os que já possuem vacas férteis com grande quantidade de leite, talvez essa atitude se torne mais difícil, mas para conquistar a pata com ovos de ouro é preciso antes de mais nada sonhar com os objetivos maiores do que aqueles que nos são apresentados. Para aqueles que estão na situação de João, com uma vaquinha com o leite prestes a secar, a necessidade de uma atitude corajosa é mais urgente. Diante dessas circunstâncias, entre deixar o leite secar e trocar a vaca por tostões capazes apenas de prolongar a tragédia estabelecida, devemos tomar consciência da necessidade de tomar atitudes surpreendentes, capazes de virar o jogo, fora das possibilidades aparentes.
Geralmente, atitudes como essas exigem certo grau de irresponsabilidade e juventude. Entretanto, quando bem trabalhadas podem ser sentimentos a serem cultivados a fim de nos fazer sair de nossa zona de conforto. Ulisses, na obra prima da Odisseia de Homero já havia vencido Polífemo, o gigante de um olho só que habitava a terra dos ciclopes. Entretanto, momentos mais tarde os Lestrigões canibais, também gigantes, aparecem para tirar o seu sossego fazendo-o resgatar forças para também vencê-los. Vencer alguns gigantes não significa que chegamos ao destino. Nossa jornada é uma eterna aventura a céu aberto.
A coragem, o ímpeto e a ousadia não devem, entretanto, compor uma cesta cheia de um eterno tormento, como quem precisa levantar-se às 3hs da manhã para correr apenas para provar para si mesmo que o corpo não tem limites. Ao contrário disso, uma vida de colheita farta e de resultados possíveis passa pela mudança de mentalidade, por fazer com que sonhar com algo diferente e novo não seja um sacrifício, mas sim um uma visão de um copo d´água gelada diante da sede por mudança. O Mudar precisa habitar a esperança e não o sacrifício, a mudança é uma consequência de uma florescência que já nasceu dentro de nós.
Tal como a juventude, o tempo é fugidio, não existe em concreto. Tudo o que vivemos, e alguma forma, ou é passado ou é futuro. O momento presente é uma função derivada que tende ao infinito, por mais próximos que possamos chegar do presente ele sempre será uma utopia. Portanto, se há uma estratégia viável para mudarmos o rumo de nossas conquistas é ter a consciência de que fizemos tudo para nos sentar na janela e termos a melhor visão quando o trem passar veloz diante da árvore florida da vida.
Se os gigantes da sua jornada já foram vencidos, acorde-os, pois a maior vitória para o gigante é te fazer acreditar que não é mais preciso lutar. É tempo para a mudança.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

De Volta para o Futuro Possível

Este Texto foi escrito no dia 28/10/2015.

De Volta para o futuro possível.

        Semana passada ocorreu um evento muito esperado pelos fãs do clássico filme De volta para o futuro II, do diretor Robert Zemeckis: enfim a chegada ao futuro. O seu segundo filme da série (1989) faz referência a um longínquo momento de 26 anos após a sua época, ou seja, dia 21 de Outubro de 2015, e mostra algumas inovações surpreendentes que alimentaram nossas expectativas acerca do futuro e das novidades que nossa sociedade conheceria após esse período de evolução.

          Marty McFly e o Dr. Brown foram capazes de interpretar com maestria o entusiasmo que teríamos se nos defrontássemos com a situação de sair de um de DeLorean/anos 80 26 anos após nossa época e nos deparássemos com pares de tênis e jaquetas automáticos e um encontro inesperado conosco mesmos em períodos diferentes da vida. Essa experiência, antes de ser uma atração cinematográfica, é uma oportunidade sociológica surpreendente capaz de nos possibilitar imaginar com arte essa realidade.

A trilogia do filme despertou em muitos de nós a curiosidade de se viver em lugares diferentes de nosso tempo, tanto no futuro quanto no passado, nos fazendo imaginar o rompimento de barreiras óbvias que nos limitam a viver em uma prisão temporal e nos obrigam a ter que conviver com tudo aquilo que já conhecemos, e que de certa forma, não nos chama muito a atenção pela obviedade.

Pensar com entusiasmo quando buscamos algo que não conhecemos é algo totalmente natural do ser humano, haja visto o sucesso creditado aos programas televisivos que investigam vidas em outros planetas ou histórias enterradas em enigmas de civilizações passadas, por exemplo. O fato surpreendente, que muitas vezes nos passa despercebido, é o motivo pelo qual esse interesse surge e nutre nossa curiosidade.

Deixando de lado as teorias antropológicas para explicar esse fenômeno, faria muito sentido olharmos para nosso momento presente e nos convidarmos à mesma proposta sugerida por Robert Zemeckis de cogitar o futuro.

Vivemos em uma sociedade que colhe os resquícios de uma transformação profunda de paradigmas sociais, onde as concepções de espaço versus tempo e virtual versus real foram brutalmente alteradas nas últimas décadas. No tempo real de hoje conseguimos transferir informações como nunca antes na história da humanidade, e essa habilidade nos proporciona uma sensação de alcance ilimitado de informações, juntamente com uma capacidade de descartá-las com muita facilidade, como, aliás, já nos alertara Zigmund Bauman em seu conceito de pós-modernidade líquida.

Diante disso, e inspirados pelo filme clássico do qual trata este texto, poderíamos imaginar o futuro de 26 anos após este atual momento em que vivemos e nos perguntar: “Como eu imagino que as coisas estarão em 2041 ?”

Certamente, a resposta variará de acordo com cada pessoa, entretanto, esse exercício nos ajuda a olhar pra frente e a estabelecer objetivos claros (com data específica) daquilo que queremos e, como consequência, a pensar os caminhos que nos levariam a eles.

Muitas vezes, as mensagens difundidas pelos filmes não conseguem interagir de forma eficiente com os seus interlocutores. Neste caso, ainda que o De Volta para o Futuro não tenha sido um marco na vida de muita gente (e se o foi, pode não ter induzido a um questionamento conceitual acerca do tempo, do espaço e de nossas vidas no futuro) não podemos negar sua capacidade de nos fazer refletir sobre o nosso hoje e o nosso amanhã.

O marco de 2041 pode ser alterado a partir da expectativa de cada um, o importante nesse caso é olharmos para frente e constatarmos se aquilo que sonhamos um dia está coerente com nossas atitudes atuais, e em não estando, temos a possibilidade de mudar os rumos de nossos atos no presente. No futuro essa possibilidade pode não existir. O instante que um dia será ficção, hoje é realidade na mão de cada um de nós, por isso, não aproveitá-lo e não tomar decisões inteligentes que garantam um futuro mais feliz para si pode ser o maior motivo de frustração e desinteresse na visualização do futuro.

A máquina do tempo existe, ela corre lenta, dia após dia, estamos dentro dela e sendo transportados para o futuro. Entretanto, ela jamais será capaz de voltar ao passado. Por esse motivo, utilize essa fragilidade para plantar hoje as sementes dos frutos que quer colher.

Assim, quando o dia 21 de outubro de 2041 chegar, será momento de se entusiasmar com o resultado de suas atitudes, não será possível voltar no tempo, como muitos irão querer, mas será possível se orgulhar das atitudes que você terá tomado.

Se existe um momento para tomá-las esse momento é Agora ! daqui a um instante esse momento será uma ficção, por isso, faça dele uma realidade agradável enquanto ainda há tempo. É tempo para a mudança.